Dentre o rol dos deveres atribuídos
aos cônjuges (por força do artigo 1.566 do Código Civil), o de fidelidade recíproca
é de longe o mais polêmico. Para sua adequada compreensão, necessária a
distinção entre conceitos de “lealdade” e “fidelidade” entre os cônjuges. A
primeira é verificada quando as condutas praticadas configuram um
comprometimento moral e espiritual entre os parceiros, quando visam à
concretização de uma relação calcada na preservação da intimidade do casal em
todas as esferas necessárias para sua salutar mantença (e não apenas sob uma perspectiva física).
Já a fidelidade, representa um comprometimento afetivo e sexual, ligado à noção de envolvimento que vai desde carícias e
conversas com conteúdo íntimo até o ato de conjunção carnal, a qual representa a
infidelidade em sua mais intensa demonstração.
O adultério, em sua
concepção clássica, constitui-se no descumprimento do dever de fidelidade
mediante prática de ato sexual com indivíduo que não o cônjuge. Até o advento da Lei nº 11.106 de 2005, o
adultério, no Brasil, era tipificado como crime pelo Código Penal de 1940 em
seu artigo 240, que impunha como penalidade a detenção de quinze dias a seis
meses. Todavia, a modernidade trouxe novas conceituações atribuídas ao
adultério, ampliando seu significado originário, adstrito a prática de relações sexuais.
A doutrina faz referência a quatro novas espécies de
adultério, quais sejam: quase-adultério (quando os parceiros, sem consumar a
conjunção carnal, trocam entre si afagos, beijos e preliminares sexuais), o
adultério-inocente (operado a partir de uma gravidez resultante de inseminação
artificial heteróloga procedida sem a autorização do marido), o adultério
precoce (quando o cônjuge, recém casado, logo após a celebração matrimonial
abandona o lar conjugal) e, por fim, o adultério virtual. Este último vem
assumindo especial relevo na atual era de incessante sofisticação das formas de
contato virtual. O adultério virtual é praticado via trocas de e-mails,
mensagens, ligações telefônicas, salas de bate papo, mensagens trocadas em
redes sociais (como o facebook) e em toda e qualquer modalidade de
relação espúria procedida eletronicamente, já que não é mais possível
elencá-las exaustivamente. Na Flórida, inclusive, há estudos que objetivam
aferir o quê pensam as pessoas casadas acerca do assunto; como se sentiriam e
agiriam ante o cometimento de adultério eletrônico por parte dos parceiros.
Embora as possíveis formas de adultério talvez nunca
deixem de surgir e de se transformar junto à própria evolução da sociedade,
gize-se que seus efeitos jurídicos são hoje irrelevantes no Brasil, seja porque
não mais passível o adultério de responsabilização penal, seja porque, civilmente, na
esfera do direito de família, desimporta a perscrutação da “causa” da
separação e decorrente atribuição de culpa a um dos consortes, já que os
efeitos advenientes da ruptura do matrimônio não terão qualquer relação com
eventual infração de algum dos deveres matrimoniais esculpidos na legislação
pátria.
Aliás, nos tempos de hoje, quiçá possa ser a fidelidade considerada como o menos importante dos deveres gerados pelo casamento, já que muitos casais modernos parecem tacitamente tolerar eventuais relações extraconjugais do parceiro sem que tal influa no desejo de continuidade do enlace conjugal.
Qual, afinal, hoje, o real alcance do significado de "adultério"?