Partindo-se do conhecimento de que uma das causas geralmente atribuídas ao divórcio é o temperamento desagradável de uma das partes, generalizou-se o pressuposto de que pessoas divorciadas são mais “complicadas”, briguentas e intolerantes. Inobstante não se possa ter acesso imediato à real causa de cada divórcio, os indivíduos divorciados deparam-se com o estigma de serem menos apropriados ou menos dignos ao casamento do que aqueles que jamais se divorciaram ou mesmo se casaram. Ora, a alternativa mais lógica, qual seja, a de que os cônjuges simplesmente incorreram em uma má-sorte na escolha, devido a uma incompatibilidade de personalidades e gênios, não surte nas mentes dos que perpetram tal estigmatização.
Consequentemente, aqueles que se divorciaram três vezes são mais estigmatizados do que os se divorciaram duas vezes, e estes, por seu turno, mais ainda do que aqueles que se divorciaram uma única vez, e assim sucessiva e sistematicamente. Assim, as condições ao novo casamento serão inversamente proporcionais ao próprio número de casamentos.
Gary Becker refere que este mecanismo cognitivo está atrelado ao século XIX e início do século XX, quando poucas mulheres participavam do mercado de trabalho e as taxas de nascimento eram bastante altas. Neste contexto, era oneroso às partes divorciar-se, de modo que somente em circunstâncias verdadeiramente “graves” o divórcio ocorria, após fundamentação de sua causa ao Juízo julgador.
Refira-se que, no Brasil, em que pese ainda previsto no ordenamento jurídico a necessidade de imputação de uma causa para se pleitear a dissolução da sociedade conjugal, a jurisprudência pátria há anos que não exige verdadeira motivação às partes para que se divorciem, mas unicamente a mera declaração (ao menos por uma) de que não mais existe comunhão de vidas, de interesses.
A Emenda Constitucional brasileira de nº 66, que deu nova redação ao 6º do art. 226 do Constituição Federal , suprimiu o regime dualista da separação-divórcio como medida imperiosa à dissolução do vínculo conjugal. Enquanto que a separação dissolvia a sociedade conjugal, o divórcio dissolve, diretamente, o vínculo entre as partes.
O verdadeiro avanço veio não a partir da supressão do instituto da separação como obrigatoriamente antecedente ao divórcio, mas sim a partir da constatação peremptória de que a atribuição da culpa pela ruptura não mais poderá ser exigida como requisito à dissolução do vínculo.
Verifica-se, portanto, uma alteração de paradigma no que tange à estigmatização do divórcio, felizmente mitigada na sociedade atual brasileira. Sob a égide do Direito de Família, que hoje possui a Doutrina Eudeimonista como seu principal vetor, melhor aceita-se e compreende-se o instituto do divórcio como medida hábil a permitir, como escopo, a busca da plena felicidade dos indivíduos, para que possam enfim relacionar-se com aqueles com quem tenham real afinidade, maximizando seu bem-estar afetivo e pessoal.
Sendo felizmente esta a atual noção, a estigmatização do instituto reduziu-se consideravelmente nos últimos anos, embora ainda se aplique às partes divorciadas, dificultando sua reinserção no mercado do casamento e gerando, assim, um expressivo custo à segunda aderência a tal mercado.
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