Por Rui Martins, jornalista (*)
Berna (Suiça) - Imagino que todos se lembram daquele momentoso caso
do filho de um americano, levado para o Brasil pela mãe que, graças a
bons contatos no judiciário, conseguiu sequestrar legalmente a criança.
Tratava-se do menino Sean Goldman, filho da brasileira Bruna Bianchi e
do estadunidense David Goldman. A situação se complicou com a morte da
mãe, pois Sean Goldman passou a viver com o padrasto brasileiro (a mãe
tinha se divorciado do americano) e com os avós.
Inconformado, David Goldman conseguiu sentença favorável pela justiça
de New Jersey, nos Estados Unidos, cuja juíza se baseou na Convenção de
Haia, da qual o Brasil é signatário.
A questão provocou intervenção da ministra Hillary Clinton junto ao governo brasileiro e mesmo ameaças de sanções econômicas.
Até
o ex-presidente do STF, Gilmar Mendes, autorizar a entrega do menino ao
pai, contra decisão, no dia anterior favorável aos avós, dada a grande
influência da família brasileira junto à Justiça.
Agora, surge um caso inverso, no qual a mãe é brasileira, de poucos
recursos, e com advogado de ofício, e o pai um suíço que, depois de ter
vivido e se casado na cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, decidiu
retornar à Suíça, ao cantão de Thurgau, levando o filho. A pretexto de
levar, a seguir, a mãe e esposa para viverem juntos.
Miriam Dorig, a mãe, foi à Suíça mas acabou sendo pressionada pelo
marido, desempregado e alcoólatra, para retornar ao Brasil. Recorrendo a
um advogado de ofício, Burkard Wolf, nomeado pelo juiz, foi orientada,
mal orientada como ela conta, para requerer o filho Philippe, do Brasil,
decisão que a fez perder definitivamente a guarda da criança.
Como o pai, Martin Dorig, viciado no álcool é constantemente
internado em clínicas especializadas, o mesmo juiz - que não quis dar à
ela a guarda da criança por ser uma estrangeira sem emprego na Suíça e
não autorizou seu regresso ao Brasil com o filho – decidiu colocar
Philippe num orfanato.
Miriam Dorig, pobre e sem condições de vir à Suíça, não se conforma
com o que considera uma decisão desumana, pois Philippe tem mãe e poderá
viver com ela em Mossoró. Miriam está tentando mobilizar amigos,
pessoas que se sintam sensibilizadad e revoltadas com esse abuso e a
mídia brasileira para ajudarem na recuperação do filho.
Isso será possível se houver mobilização popular e da imprensa,
inclusive na Suíça, pois a subtração de um filho da mãe biológica para
entregar a um orfanato constitui uma flagrante violação da Convenção de
Haia.
Num passado recente, a Suíça retirava a guarda dos filhos de famílias pobres, as “crianças roubadas”,
para entregar como mão- de-obra barata para agricultores. Uma parte
dessas famílias eram ciganas, mas muitos suíços de origem viveram essa
tragédia, o que justificou uma recente exposição itinerante “Crianças Roubadas”, iniciada no Fórum do Kafigturm, em Berna.
O
prefeiro de Mossoró prometeu financiar a vida de Miriam Dorig à Suíça
para tentar reaver seu filho, porém, só com o apoio dos brasileiros
residentes na Suíça e da imprensa brasileira e suíça se poderá retirar
Philippe do orfanato para entregá-lo à mãe. Já foi feito um apelo à
Subsecretaria-geral das Comunidades Brasileiras no Exterior, órgão do
Itamaraty, e ao Consulado de Zurique para que, além dos trâmites legais,
possam agir junto ao governo suíço.
É importante assinalar que se
trata de um menino nascido no Brasil, praticamente sequestrado pelo pai
suíço e internado num orfanato suíço, por decisão de um juiz suíço.
Será que o governo brasileiro, chefiado por uma mulher, irá permanecer impassível?
* * * * *
Rui
Martins é escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura, é
líder emigrante, membro eleito do Conselho Provisório e do atual
Conselho de Emigrantes (CRBE) junto ao Itamaraty. Vive em Berna, na
Suíça. Escreve para o saite Direto da Redação. É autor do livro Dinheiro
Sujo da Corrupção sobre as contas suíças secretas de Maluf. Colabora
com o Expresso, de Lisboa, Correio do Brasil e agência BrPress.
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